Antes de perder o meu pai para a morte, eu o reencontrei.

Há muito tempo que não tenho vontade de escrever aqui, mesmo sabendo que me faz muito bem usar uma folha em branco e preenche-la com meus pensamentos e emoções. Sei que não vou conseguir transpor o vácuo criado desde a última postagem, a minha memória que parecia estar falhando, na verdade está mais seletiva do que nunca quando me refiro às lembranças.
Sem sombra de dúvidas o que mais me marcou durante essa longa ausência foi a morte do meu pai. Uma agonia de 50 dias em que a  sua saúde foi se esvaindo lentamente. Talvez o pior de todos os dias antes da sua morte, foi o Dia dos Pais. Meu pai ficou a maior parte do dia dormindo por conta dos medicamentos. Minha irmã e minha mãe vieram nos visitar um dia antes, portanto, não voltariam mais. Senti uma solidão imensa. Chorei na hora do almoço dentro de um refeitório quase vazio, e o que é pior, comendo uma comida horrível. Lembrei de todos as comemorações que vivemos no passado em família e senti uma dor imensa. Lembro-me de deixar o prato quase intocado, que acolheu as minhas lágrimas.
Nesse dia ficou claro que nunca mais teria o meu pai para comemorarmos o nosso dia. No horário da visita fiquei olhando no corredor na esperança de receber uma visita de surpresa e ninguém apareceu. Eramos eu e meu pai trilhando um caminho que não teria volta. Quando meu pai acordou, já afetado pela demência que ia e voltava, o abracei na cama, segurei suas mãos e o beijei como nunca tinha feito até então. E ele retribuiu da mesma forma. Logo depois veio o jantar e ele voltou a dormir profundamente por conta do calmante minúsculo que o derrubava.
Daqui há poucos dias terei contabilizado 3 meses sem meu pai. O meu aniversário foi também muito difícil. Não fiz nada de especial, mas minha mãe me surpreendeu com um bolo e pastéis. Havia um esforço grande por parte dela para realizarmos a comemoração. Mas o luto foi maior e cheguei em casa mais entristecido do que quando havia saído.
Hoje os episódios de choro são mais esporádicos, mas já chorei muito. Chorei de forma tão intensa a perda do meu pai para a morte, que por pouco não perdi o controle sobre mim mesmo. Acho que Deus me segurou com firmeza nesses dois momentos, dos quais não quero discorrer aqui.
Nesses dias desafiadores em que fiquei ao seu lado, cumpri o meu papel de filho com tanta coragem e determinação que até eu me surpreendi. Não havia cansaço ou dor, apenas a certeza de que tinha que fazer o melhor possível e que esta seria a minha última parceria com meu pai.
O tempo passou rápido demais e nunca consegui pedir a Deus para que o poupasse da morte. Papai morreu sem dores. Me reconforta saber disso. Mas eu sabia internamente que ele não sobreviveria. Deixei a vida cumprir o seu papel mais forte, o de permitir a morte prevalecer. Eu tão otimista e cheio de esperanças, tive que encarar o desafio de aceitar a minha incapacidade de mudar o que vivia.


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