Mas tenha calma comigo!

Depois de ter lido antigas postagens deste blog que me fizeram chorar, voltei a escrever motivado por estar em férias e pelo efeito terapêutico em minha alma. Não sei ao certo por onde começar. Posso relatar aprendizados, mudanças, transformações, desafios, encontros, reencontros e desencontros que  me deixaram mais forte e seguro para tomar decisões sem sentir um pingo de remorso ou culpa. Muitas decisões foram adiadas por décadas, mas  com o tempo tornaram-se um fardo para mim. Vou começar pelos desencontros, que lentamente foram acontecendo. A lentidão me permitiu ir amadurecendo atitudes de forma a consumá-los com bom senso.
Assim, em alguns relacionamentos não me foi mais possível fazer "vista grossa" aos muitos deslizes e a um desgaste imenso, que colocou fim à confiança por anos depositada. Ficou muito evidente que só havia o interesse cruel de fuxicar a minha vida e da minha família. Não havia mais um interesse amoroso e solidário. Além disso, um desequilíbrio emocional, difícil de contornar se manifestou.
A única forma de resolver foi me desencontrar, quer dizer, não somente me afastar, mas romper com uma pseudo amizade e manter uma relação formal. Sofri um pouco, mas superei rápido. O que mais me causa perplexidade, foi que agora não faz a menor diferença. Sabe aquela velha estória de pessoas que perdem a afinidade ao longo de uma vida, foi mais ou menos assim. Acabou.
A minha paciência está cada dia menor, assim como a minha visão. Está difícil me adaptar ao multifocal. Não consigo mais escrever sem o raio do óculos. Mas deve ser um sintoma direto da minha impaciência com muitas pessoas, me sugeriu um amigo terapeuta. 
Me sinto bem rabujento e quando dizem que eu estou ficando velho, adoro dizer: Estou sim, e daí? Também acho o máximo quando me cedem o lugar no ônibus achando que sou um idoso. Amo a minha barba branquinha, nem preciso fazer cara cansado!
A morte do meu pai foi mais um grande divisor de águas na minha vida. Levei meses para desmontar a nossa casa, depois que minha mãe foi morar com a minha irmã. A missão foi cumprida com coragem. Vendi e doei muitas lembranças felizes. Ficamos com muito pouco. A reforma da casa que em 2020 fará 60 anos, deu a ela uma sobrevida. A casinha moderna ficou linda. Eu usei as cores do passado para homenagear o bom gosto dos meus pais. Mas por vezes, ainda me pergunto: Como fui capaz de destruir essas lembranças de família, da vida que não tenho mais? Porque eu precisava prosseguir. Lembranças felizes não podem se apoiar em roupas velhas ou móveis antigos, mas nos sentimentos compartilhados que foram muitos.
A casa agora vazia permanece inundada de lembranças, basta eu entrar e fechar os olhos e sinto tudo. Escuto meu pai abrindo o portão cheio de sacas, sinto o cheiro do feijão da minha mãe pulando na panela, vejo a minha irmã brincando na calçada, a minha filha ainda criança tremendo de felicidade ao ver um gato pela primeira vez na vida, vejo a minha afilhada engatinhando pela casa, sem contar as comemorações de Páscoa, Natal, Ano Novo, Dia das Mães, Dia dos Pais, Aniversários...
Todas a comemorações continuam da mesma forma, mas mudaram de local. O que ainda faz muita falta, é a presença do meu pai. Sei que a hora dele chegou, que não havia mais como continuar. A vida deixou isso bem claro para mim. Por isso, sei que ele não escapou da ordem natural da vida.
Essas transformações inevitáveis continuam me obrigando a me reequilibrar continuamente. O equilíbrio inicial foi rompido. Perdi além de meu pai, três tias muito queridas em dois anos. A vida parece que tem pressa em nos ensinar e não há como resistir. Mesmo assim, curto muito no que venho me transformando. Pronto para novos desafios, Senhor! Mas tenha calma comigo!




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