Eu não te disse para não comprar essa droga de revista!

Hoje me detive diante da capa de uma revista na fila do caixa de um supermercado. O título falava de pessoas que depois de perdoarem passaram a se sentir leves e felizes. Pensei comigo: já fui assinante dessa mesma revista por anos e diante da atitude tendenciosa e desrespeitosa com que tratava assuntos sérios e seus leitores, decidi cancelar a assinatura. Mas hoje fiquei tentado em comprar um exemplar. Mas resisti bravamente. Acho que ficaria furioso comigo mesmo ao constatar o tratamento jornalístico, superficial e apelativo dado ao tema pelos redatores. Eu seria mais um a ser enganado e teria que ouvir a minha consciência dizendo por muito tempo: bem feito, eu não te disse para não comprar essa droga de revista, blá, blá, blá.
Mas aonde quero chegar? Bom, independente do que venha fazer, comprar o raio da revista ou não, foi bom relembrar do pacto que fiz comigo mesmo. Tenho que buscar o perdão dentro de mim e as razões que impedem que ele aconteça em todas as áreas de minha vida, principalmente diante das relações humanas. Já fiz grandes avanços diante dos ressentimentos. Eles estão caindo aos poucos, como frutas passadas ainda agarradas nos galhos de uma árvore. Já perderam o sentido em sua maioria. Os ressentimentos que ainda sobraram estão agarrados ao meu orgulho, outro que me dá um trabalho danado, pois sempre me coloca em posições defensivas diante das pessoas que preciso voltar a interagir.
Isso significa que preciso voltar a olhar para elas, aceitando-as como são, sem necessariamente voltar a ter a mesma relação com elas. Na verdade, mesmo que por outro motivo não consiga me aproximar destas, o meu olhar precisa ser de compaixão.
Não que eu seja melhor que elas, mas ao reconhecer características humanas comuns entre nós, as diferenças deixam de pesar.
Hoje consigo levantar meus olhos e fixá-los em muitas pessoas que outrora ignorava solenemente. Existia uma culpa interna silenciosa que sempre apontava minhas fragilidades, limitações e dificuldades, muitas das quais não tolerava nas pessoas e que habitavam em mim.
Nunca gostei de pessoas sem caráter, incapazes de tomar posições firmes diante de situações emergenciais. Tinha raiva de covardes e omissos. Sem contar que se pudesse bateria em todos os bêbados que cruzassem o meu caminho! Eu nunca fiquei bêbado em toda minha vida e quando sentia que as coisas estavam ficando estranhas, parava quase sempre no primeiro copo. Me desesperava perder a consciência do que sou.
Por um lado é bom, pois ao chegar em casa via o semblante de alívio de meus pais. Eu ganhei a chave de casa aos 13 anos e essa foi uma das maiores conquistas de minha adolescência. Parecia um prêmio e era mesmo. Eu fui (sou) um filho muito legal e sempre gostei de reforçar a credibilidade que meus pais haviam me dado.
Por outro lado, por não beber tinha que ouvir piadas de meus amigos adolescentes (aliás, ouço até hoje) que eu iria para o céu, que iria virar padre, pastor etc. Mas pior era ouvir papo de bebum até deixá-los em casa...
Por conta disso, hoje praticamente não bebo. As vezes, faço um esforço para beber uma taça de vinho tinto, durante o almoço para ajudar a reduzir meu colesterol. Mas não consigo beber mais do que duas taças por semana e olhe lá. Admiro ver aqueles especialistas em vinhos discorrendo sobre o aroma e paladar de vinhos, que podem ser frutados, encorpados etc, mas este não é meu mundo definitivamente.
Afinal de contas eu tenho motivos muito fortes para não chegar perto de bebidas, cigarros ou qualquer outro vício destrutivo que afete a minha saúde e minha credibilidade como homem, esposo, pai, filho e irmão. Quem acompanha a minha vida desde a adolescência vai matar logo. Quem não me conhece, um dia vai saber, quando eu conseguir superar um de meus maiores ressentimentos.
Estou curtindo o meu recesso escolar. As duas semanas estão passando lentamente para meu total deleite, apesar dos trabalhos que ainda tenho que corrigir. Vivo sem sobressaltos ou expectativas desnecessárias. Faço o que posso dentro de meus limites pessoais. Se não for possível fazer hoje, faço amanhã, só não posso deixar de fazê-lo.
Ainda preciso de tempo para amadurecer escolhas futuras. Elas envolvem a minha família e não tenho como tomar decisões sem levá-la em conta.
Tenho uma família que amo muito e consegui construir outra tão boa quanto a primeira. Sei que não posso escolher as pessoas com as quais tenho vínculo afetivo hoje, mas acreditar nestes vínculos tem sido um dos maiores investimentos que tenho feito na vida. Bom mesmo é saber que isso deixa de ser trabalhoso quando perdoamos secretamente a quem um dia nos feriu. E melhor ainda, é estar desarmado diante do outro a partir de agora.

Comentários

Gabriel Cardoso disse…
Muito bom professor! Me familiarizei com o texto, principalmente porque também ganhei minha chave de casa lá pelos meus doze anos hahaha!

Tenho um blog também, se quiser visita lá: www.flocoscombacon.blogspot.com

abraço e sucesso!
Obrigado, Gabriel Bob!
Vou lá no seu blog também.
Abraços

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