Andando sentado

Depois de uma semana bem atribulada de trabalho, finalmente estou tendo a chance de escrever um pouco. Não vou falar de trabalho, pois é muito chato falar de trabalho quando se está cansado e pior ainda, falar de dinheiro quando se está duro. Ninguém merece ouvir ou ler isso. Eu nunca gostei de ficar me lamentando. Prefiro agir, pois se me cabe fazer, faço. E que bom que posso fazer e tenho iniciativa de sobra, aliás, minha filha também! O único problema que tinha, era de me sobrecarregar com um prazer imenso. Agora, permito que cada um faça a sua parte.

Tive três dias desafiadores. Na última 6a. feira, acordei com uma dor lombar terrível, sintomas da velhice chegando. Levantei cheio de dores e comecei a andar sentado. Lembrei-me de imediato de uma tia de 80 anos, que por força da velhice anda desse jeito e das boas gargalhadas que eu e minha irmã demos ao vê-la andando desse jeito. Resultado, aos 47 anos andava como se estivesse com mais de 80! Fui ao médico, tomei medicamentos e hoje já voltei aos meus 47 anos, lépido e fagueiro.

Na 2a. feira, quando chegava em casa com minha filha, depois de ter ido pegá-la na escola, aconteceu de novo. Parei e dei seta para entrar em minha rua. Logo atrás de mim pára um vistoso Corolla. E logo depois, vem um Fiorino destrambelhado que não conseguiu parar. Resultado. Ele acabou batendo na traseira do Corolla, que por sua vez bateu na traseira do meu Palio. O meu prejuízo foi pequeno e nem vou pagá-lo, mas a seguradora do Corolla. Este virou uma sanfona por conta da frágil carroceria. E o Fiorino culpado, teve pequenas avarias no para-choque e radiador.

Depois de me certificar que minha filha estava bem, ví que valeu a pena ter brigado com ela para que se sentasse na cadeirinha e fosse "amarrada" no cinto de segurança.

Saí do carro e fui averiguar o impacto. Junto comigo, sai furiosa a dona do Corolla esbravejando que estava indo para o Rio de Janeiro. Logo depois chega o motorista do Fiorino arrasado. Pedia desculpas e dizia que nunca havia batido na vida. Eu saí logo dizendo: a primeira batida a gente nunca se esquece!

O trânsito ficou caótico por conta do sinistro. E depois de 1hora e 30 minutos tentando falar com a polícia, a funcionária de uma loja de estofados, foi gentil em ficar tentando fazer contato com a Delegacia, pois nossos celulares descarregaram nos primeiros 30 minutos de tentativas.

Enquanto a polícia não chegava, a saída era acalmar-mos. E o bate-papo rolou naturalmente. Eu estava sereno e consegui acalmar os outros dois motoristas: um se sentia culpado e a outro, fumava um cigarro atrás do outro. Logo a seguir, minha esposa chega e leva minha filha para casa. E lá ficamos a esperar. Que bom que a polícia demorou. Trocamos placas, telefones, cartões e e-mails. Discutimos política, salários e perdas ao longo da vida. Descobrimos que nosso encontro forçado tinha um propósito e ele aconteceu. Tomamos decisões práticas e com muito bom senso e terminamos dando gargalhadas e batemos palmas quando finalmente a polícia chegou com seu carro semi-detruído.

Antes disso, pude observar os motoristas e passageiros de ônibus que nos olhavam com ar de reprovação. Quando percebemos os olhares passamos a rir muito. Todos deviam estar pensando que éramos loucos, pois foi uma tripla colisão e estávamos atrapalhando bastante o trânsito. Mas fazer o quê?

Muitos conhecidos e vizinhos me ofereceram carona. Outros me disseram que estavam arrasados com o que havia acontecido com o meu carro com apenas 1 mês de uso. Fiquei bolado, como dizem meus alunos.

O que de fato era importante? Estávamos todos vivos. Isso era mais importante do que qualquer pedaço de lataria amassada. Foi muito bom ter participado desse "tripa colissão" (foi assim que escreveu o policial no boletim de ocorrência). Reencontrei um amigo depois de muitos anos e conheci uma pessoa muito especial, que "tirava de letra" a situação, pois depois de tantas perdas, já estava calejada e via a situação com uma naturalidade surpreendente, passado o susto inicial. Sabe o que mais me cativou nessa senhora? Não havia o menor sinal de amargura ou dor. E posso garantir que suas perdas foram enormes! Não posso dizer quais foram. É mais um segredo de amigo que guardo.

E finalmente, depois de uma 3a. feira sufocante no Rio de Janeiro em novembro, acomodei-me na poltrona do ônibus para Petrópolis. Adormeci rápido dentro daquele ambiente climatizado. Ainda vi alguns cariocas presos dentro de ônibus urbanos acalorados e suando "em bicas". Adormeci e sonhei que chegava em casa. Jantaria antes de dar aulas no período noturno.

Acordei depois de 2 horas de viagem. Estava parado dentro do túnel da Rio-Petrópolis. Depois de 3 horas, em meio a uma chuva pesada chegamos na Rodoviária. Perdi as três primeiras aulas, não jantei e ainda tive que falar com o meu diretor o que havia acontecido.

Como sempre acha que estamos mentindo, entreguei-lhe o atestado médico, o boletim de ocorrência da colisão e a passagem do ônibus.

Não sei o que passa em sua cabeça, mas fiquei feliz em perceber que ele ficou perplexo com as provas que lhe dei.

Por que será que temos que provar às pessoas o que somos e o que fazemos? Dá uma vontade danada de mandar essa gente para o espaço sideral. Mas é bom esperar o momento certo para "dar o troco" e deixá-las mudas e sem ação. Eu gosto do elemento "surpresa" em muitas situações.

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