Viver como exercício de eternidade

Gosto das crônicas pela ligação fácil com o meu viver.
Não conseguiria escrever poesias, pois minha alma é demasiadamente prática e pouco romântica. Gosto de romance, das paixões, mas não a ponto de perder o controle sobre meus pensamentos, sentimentos e desejos. Não escrevo poesias por ser incapaz de viver para sonhar, mas sonho para viver. Me falta um elemento dramático e desestruturador para poder mergulhar em uma poesia. Deve ser por isso que gosto de Manuel Bandeira. Poesias exigem um desprendimento e uma coragem enormes de quem as coloca no papel.
E quando todos os sentimentos básicos nos parecem irreconhecíveis de uma hora para outra?
Por vezes passo por períodos de aridez em minha vida. A cada ano percebo que duram menos, pois sempre vou direto ao que desencadeou tal aridez. Estou muito sintonizado nos impactos que a vida produz a minha pessoa. Assim, antes de tudo, reconheço-me como ser humano e flexibizo-me para absorver os impactos e não permitir que paralisem minha vida.
Uma vez dentro desse "estado de aridez", há uma escassez de palavras para se expressar com clareza, os sentimentos parecem estar adormecidos, as pessoas se transformam em incógnitas, os desafios se apresentam intransponíveis, os dias chuvosos parecem durar uma eternidade e o que é pior, nos sentimos extremamente sós. Em alguns casos, as palavras podem ferir muito, não por serem duras, mas pela dolorosa sensibilidade. Da mesma forma, que o silêncio do outro pode significar indiferença e desamor, como se fosse um punhal nos atravessando lentamente.

Todos nós já experimentamos esses momentos e não há qualquer razão para não deixar claro aos que estão próximos o que estamos vivenciando. Por que não buscar apoio entre aqueles que sabemos que sempre estarão de braços abertos para nos acolher? Nem todas as pessoas estão preparadas para "ver" que se passa dentro de nosso coração. Por isso, abra-se com coragem. Não há o que temer ou perder, mas seja criterioso na escolha, pois são poucas as pessoas merecedoras de confiança.

Acolher é tão bom como ser acolhido. Confiar é tão bom quanto ser de confiança. Amar é tão bom como ser amado. Não existe uma explicação, mas da mesma forma que a aridez chegou ela se vai. O que nos deixou de aprendizado? Que não podemos viver sós, que não dá para negar nossos sentimentos mais autênticos, que pedir ajuda não é sinal de fraqueza e que chorar faz um bem enorme para a alma nessas horas, principalmente nos braços daqueles que nos amam e nos conhecem tão bem. Mas o melhor é que sairemos dessa, melhores e fortalecidos para quando novos períodos de aridez emergirem. Não é preocupante a tristeza momentânea diante da vida, mas é perigoso quando não conseguimos nos libertar dela.

É bom dividir com o mundo todo, tudo o que sentimos. Melhor ainda é reconhecer que somos humanos, sem excessões, e o que escrevo aqui me identifica com você que está lendo agora e por sua vez, nos identifica com toda a humanidade. É por isso que viver sempre será um exercício de eternidade.


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